17/03/2009

IMAGEM CORPORAL

Todo indivíduo possui uma imagem corporal de si e uma bagagem gestual construída desde a primeira idade, e que está em contínua transformação. A história individual está registrada em seu corpo, através de tensões, postura, gestualidade, ritmo, enfim, através de tudo que ele expressa. Trabalhá-lo significa encadear todo um processo de mudanças, que se refletirão em todos os campos de atuação do indivíduo.
O bebê já tem percepções e sensações na fase intra-uterina. Ao nascer, experimenta uma gama incrível de novas informações sensoriais. Quando sente fome, sede ou frio vivencia a sensação de desprazer que, em termos corporais, gera contrações. Nas sensações prazerosas, responde corporalmente relaxando e descontraindo a musculatura.
Esse processo continua durante toda sua vida e qualquer mudança psíquica provoca uma resposta motora, como tensão ou relaxamento muscular. Essa relação entre atitude psíquica e corporal é tão próxima que não apenas a mudança de atitude psíquica provoca reações musculares, mas também toda mudança de estados de tensão e relaxamento provoca alteração nas atitudes psíquicas.
Criamos um registro corporal através das respostas às percepções e sensações experimentadas. Esse registro, ou memória corporal, permanece, mesmo em relação a acontecimentos que não sejam mais conscientes. Podemos dizer “que cada ser é seu corpo. Se você é seu corpo e seu corpo é você, este poderá expressar quem você é. É sua forma de estar no mundo. Quanto mais vivo for o seu corpo, mais vivamente você estará no mundo.” (LOWEN, 1975, p. 48)
Através de exemplos simples podemos observar esse registro corporal. Uma pessoa que passa por uma fase de depressão tende a restringir sua respiração, tornando-a mais curta e superficial. Os movimentos da caixa torácica tornam-se limitados e a musculatura envolvida deixa de ser utilizada em sua plenitude. Músculos sem exercício tornam-se fracos e têm menos plasticidade. Quando esta pessoa quiser respirar amplamente irá encontrar resistência física.

Se uma pessoa machuca um pé, ela compensa jogando o peso na outra perna como forma de evitar a dor. Com o passar dos dias, as musculaturas que estão sendo sobrecarregadas tornando-se mais fortes em oposição às musculaturas do pé afetado. Quando a dor passa, a pessoa pode ter a impressão de parar de mancar, mas o padrão compensatório permanece de forma sutil. A musculatura que sofreu sobrecarga evitará que o peso volte a cair no pé da mesma forma que antes do machucado. O corpo se manterá em equilíbrio precário. Com esses exemplos, fica fácil compreender que o corpo tem memória e que nossa história está registrada em nosso corpo, mesmo que não tenhamos consciência disso.
Nossa auto-imagem ou imagem corporal é construída, principalmente, através da ação e está em contínua transformação (SCHILDER, 1999). Podemos concluir que a ação em relação ao nosso próprio corpo, aos objetos e a outras pessoas, amplia nossa sensibilidade e consciência sobre as várias partes de nosso corpo e nos ajuda a senti-las de forma integrada. Quanto mais mobilizarmos nossas musculaturas e articulações através do movimento, tanto maior será a percepção adquirida de nosso corpo e de suas potencialidades de expressão.
O modelo que construímos do nosso corpo é subjetivo e vai além da estrutura física; dessa forma, a imagem corporal se estende a objetos e se propaga no espaço. Ao se propagar no espaço ela cria uma espécie de aura ou zona de sensibilidade que varia conforme situações específicas. Para senti-la basta que alguém com quem não tenhamos intimidade se aproxime de nós. Mesmo que não sejamos tocados, sentiremos a intromissão da pessoa em nossa imagem corporal. Essa zona de sensibilidade, juntamente com fatores relativos à educação e à cultura, explicam a distância espacial que estabelecemos em relação às pessoas. Quanto maior nosso grau de intimidade, maior será nossa proximidade corporal. Podemos, assim, verificar a estreita relação entre nosso estado emocional, a zona sensível que envolve nossa imagem corporal e o espaço físico.
A percepção de nosso corpo e, consequentemente, seu uso como veículo expressivo, podem ser bastante prejudicados se a energia deixar de fluir livremente pelo corpo, devido ao acúmulo de tensões musculares. Essas tensões podem ser fruto de má postura proveniente da adaptação por longo tempo a objetos sem critérios ergonômicos, como uma cadeira, por exemplo. Também podem ser resultado de situações emocionais ou físicas dolorosas e ameaçadoras. Caso o trauma seja repetido ou mesmo muito forte, não conseguimos liberar essas tensões, que se tornam crônicas.
A tensão crônica pode atingir níveis tão elevados que deixa de ser sentida conscientemente. A contração reduz a amplitude dos movimentos devido à rigidez e à falta de energia, e as partes atingidas podem dar a impressão de estarem engessadas. Quando o fator de origem dessa tensão é emocional ou de ameaça física, ela gera uma espécie de escudo corporal, uma couraça protetora contra impulsos ameaçadores de terceiros ou de nossa própria personalidade.
Em termos de comunicação, tensões musculares impedem a livre circulação de energia pelo corpo e fazem com que nossos movimentos e gestos não ocorram com a fluidez e a harmonia necessárias. Nossa auto-expressado fica limitada e, como não somos capazes de nos expressar de forma satisfatória, nossa capacidade de sentir prazer e manifestar criatividade diminui. Mesmo que tentemos nos expressar com entusiasmo através das palavras, nosso corpo não mentirá e provocará a sensação de estranhamento em nossos interlocutores.
Como foi dito, é principalmente através do movimento que construímos nossa imagem corporal e também é através da ação que podemos modificá-la. Ao nos movimentarmos podemos trabalhar as tensões e a rigidez de nossa imagem, fazendo com que o fluxo energético percorra nosso corpo de forma mais equilibrada e, ao mesmo tempo, estaremos trabalhando mudanças de atitudes psíquicas.
Outra forma bastante efetiva de atualização da imagem corporal pode se dar através da massagem. Destacamos a abordagem biodinâmica por considerar o indivíduo tanto em suas condições emocionais quanto em suas funções físicas relacionadas. De forma geral, a massagem biodinâmica busca a auto-regularão energética, através da remoção de carga residual de estresse ou de um excesso de carga emocional no organismo. A massagem pode ser realizada com diferentes intenções, ritmos e formas de toque e, também, em diferentes camadas (pele, músculos e ossos), considerando as áreas com excesso, estagnação ou falta de energia. Assim, ela atua tanto na dissolução da tensão muscular crônica (hipertonia), quanto na vitalização de áreas com pouco tônus muscular (hipotonia).
Ao nos libertarmos de padrões estabelecidos, somos capazes de entrar em contato com a realidade e agir sobre ela de forma viva, espontânea, ou seja, a ação ajustada à situação do momento. Nos envolvemos de forma física, emocional, intelectual e, principalmente, intuitiva; e criamos novas possibilidades de interação, como forma de descobrir e desenvolver novas potencialidades.


Gisele S. Jorgetti
Integrante do Núcleo MOTIN

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